quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O meu Citroen 2 cv uma história curiosa... (Parte 2)






Mas a história não iria ficar assim...


Pois como muitos sabem estes carrinhos apesar de muito resistentes teem pontos criticos a serem cuidados.


Nos primeiros testes a sério depara va-me com a emoção de conduzir o meu 2 cv e a duvida de se estaria realmente tudo bem.


O motor pegava muito bem. E até parecia muito são porem em subidas pouco acentuados parecia que ia desligado.


Nem com prego a fundo vencia a menor das subidas obrigando a jogar sempre com mudanças baixas.


Pensei... "Mas que raio de inferno, os outros que eu conduzi não eram tão fraquinhos"


Pois não!


Depois solicitar apoio a um amigo destas coisas que é apaixonado por Citroen 2cv tive a certeza de que tinha de avançar para a colocação dos segmentos.


No mesmo dia que tirei esta foto desmontei todo o motor e a frente do carro.


A odisseia estava iniciada.


segunda-feira, 2 de novembro de 2009

O meu Citroen 2 cv uma história curiosa...


A minha história com o Citroen 2 cv começou desde pequenino quando o meu pai o chamava de calcinha arregaçada. (talvez pela altura anormal do guarda lamas).
Havia os anúncios na televisão inclusive um que se via a equipe da filmagens no reflexo do carro…
E durante muitos anos esse carro parecia morar no meu imaginário.
Entretanto deixei de o ver por ai a circular., e confesso para minha vergonha que durante anos me esqueci deste modelo tão querido.
Iniciei-me em 2000 no mundo dos carros antigos com a minha carrinha FIAT 128 e nessa altura é que comecei a voltar a ver o chamado patinho feio da citroen.
Mas enfim nunca me tinha chamado a atenção em especial.
Um dia estava eu a falar com o meu amigo Joaquim Domingos e proporcionou-se uma ida a Oliveira de Azeméis onde ele foi buscar um 2cv que tinha sido restaurado de A a Z
Detestei tal carro.
Fiquei completamente desiludido. Nunca pensei de ser tão mau…
Mais tarde num encontro de clássicos tive hipótese de conduzir outro citroen 2 cv de outro amigo, o Victor Galinha.
Fiquei mais convencido. Aquele vidro de cristal estava ficar cada vez mais atractivo.
Mais tarde voltei a ter hipótese de pegar no carro do meu amigo Joaquim e rendi-me ao sabor de tão duradoura maquina.
Decidi que iria ter um Citroen 2 cv custa-se o que custa-se!
Em Fevereiro deste ano aconteceu!
Encontrei em razoável estado um 2cv capaz de ser um projecto de restauro interessante e ei-lo aqui

Luís Fernando Silva

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Um sonho de Adolescencia




Á muito que a ideia de restaurar o primeiro carro que eu comprei me vinha atormentando. A vida, porem nem sempre permite perseguir sonhos e por vezes temos de esperar até atingir as condições de realização dos nossos desejos.
O sprint veloce foi um dos carros de culto da minha adolescência ou não se trata-se de um coupe típico.
A presença da adrenalina intensificava-se com aquele som distante e rouco que antevia a passagem do carro dos meus sonhos em frente dos meus olhos.
Como nem sequer tinha carta ou possibilidade de a ter com quinze anos, o desejo ia sendo contido… embora nunca tivesse passado de todo.
Em Janeiro de 1996, a velha carrinha Fiat 128 começava a dar amplos sinais de desgaste em relação á utilização que lhe era exigida.
Junto com o meu pai decidimos que já era tempo de surgir um novo veículo de transporte na família (Sem nunca desprezar a amada branquinha que continuaria a ser utilizada pelo meu pai…)
Fomos até um stand em Setúbal, de um amigo do meu pai para ver as possibilidades de compra mais imediatas…
Ao fundo stand lá estava a inspiração da adolescência, o desejo contido ao alcance de um cheque…
Um Alfa Romeo Sprint veloce de 1987 de cor cinzenta com apenas 42.000kms a pedir por tudo…
Compra-me!!!
Foram todas a economias conseguidas em seis meses de trabalho, 750cts mas valeu a pena.
Este foi o começo de uma grande amizade da qual nunca mais abdiquei!
Durante seis anos este foi o meu companheiro fiel para qualquer deslocação.
As saídas com a namorada, mais tarde esposa uma ou outra viagem pelo norte de Portugal e claro… as deslocações quase diárias para o emprego em Setúbal, foram estreitando este relacionamento de amizade.
Em 2001 o meu “amigo” já com 100.000kms acusava os primeiros sinais de cansaço. Começava a gastar óleo entre os intervalos da revisão e a força de “trepador”, em subidas, já obrigava a trabalho de caixa de velocidades.
A velocidade de curso continuava a ser uma tónica mas o velho Alfa estava a ficar indiscutivelmente cansado.
Estava a chegar ao momento de trocar de veículo…
As deslocações para Setúbal já imponham a necessidade de um carro mais económico, assim como as necessidades familiares não eram já compatíveis com um coupe.
Mas podemos alguma vez abandonar um amigo só por que deixou de nos interessar?
Claro que não!
O novo carro a diesel foi comprado mas o Alfa Romeo sprint continuaria a existir no seio da família!
Primeiro tratar do motor.
Com o apoio do mestre Fernando Neto o motor foi retirado e revisado ao mais ínfimo pormenor, levando apoios novos, segmentos, rolamentos e tudo a que um motor saído de fábrica teria direito mais o carinho e gosto pessoal deste amigo mecânico. A antiga pujança do meu carrinho foi assim recuperada até ao mais ínfimo pormenor.
No final desta grande revisão diz-me assim o mecânico:
Só os segmentos acusavam desgaste… todos os restantes órgãos mantinham as medidas de fabrica… É muito raro encontrar sprints assim (O mesmo digo eu em relação a mecânicos…).
Faltava agora a plástica… Em termos de chapa o Sprint estava muito estragado com zonas de corrosão tão acentuadas que uma simples caneta era suficiente para atravessar a chapa de um lado a outro.
Foi necessário aguardar mais de um ano até reunir as condições necessárias a um restauro cuidado. Em Março de 2004 entrou numa oficina de bate chapa e pintura para ficar, durante cinco meses submetido aos cuidados do mestre Custódio na Auto-escapes do Sul, no Barreiro.
Dificuldades?
Frisos laterais; elevadores dos vidros traseiros e tecido para os estofos.
Apesar do modelo não possuir ainda 20 anos é impressionante a dificuldade em arranjar peças de substituição. Inclusive na própria marca.
Mas enfim…
O meu Sprint está de novo nas estradas com toda a honra que merece, e a partir de agora está de novo pronto para a acção e para se encontrar com outros clássicos do mesmo nível.
Vale ou não vale a pena sonhar?

Luís Fernando de Oliveira e Silva

Uma história de Moçambique

Esta é uma das muitas histórias que a minha amiga Beatriz (Chamemos-lhe assim…) me contou nas longas horas que passamos no nosso trabalho.
Beatriz, enfermeira de profissão, como eu… é uma mulher modelada por uma vida cheia. Contudo, tal como de uma adolescente se tratasse, é visível em cada palavra descrita por sua boca, todo o sentimento da memória reavivada.
Sempre com um estilo inigualável, Beatriz consegue sempre ser aquilo que se define de uma senhora.
Mas esta história aconteceu em Moçambique e envolve um carro conforme facilmente se adivinha.
Apesar de ser de uma família com aquilo a que antigamente se designava de “posses”, Beatriz desde cedo se revolveu a fazer pela vida pondo em uso a sua profissão…
Trabalhava então no hospital distrital de Téte em Moçambique.
Corriam os loucos anos sessenta, em que carros como o “carocha”, o mini ou o Fiat 600 eram reis da estrada. No caso em particular tratava-se do Renaut 8 de motor 1100, também um dos reis da estrada de então.
Veiculo adquirido a custo de economias, pela Beatriz para utilização diária. O Renaut 8 segundo, o seu relato era um veículo lindo de cor verde-claro, com uma lista preta a correr toda a carroçaria e motor traseiro…Enfim!
Neste momento é visível uma pontinha de emoção, nas palavras da minha amiga… Talvez da recordação feliz do seu carrinho ou da envolvente paisagem tropical que serviu de cenário a esta história.
Não sei! O que sei é que toda esta história revivida por Beatriz transpira de saudade de tempos e lugares já perdidos…
Voltando à história.
Beatriz namorava na altura um jovem ainda hoje descrito por ela como bonito e charmoso, mas bastante indeciso em termos de assumir uma relação que já à algum tempo se adivinhava entre os dois.
Corria o ano de 1971… Naquele dia a minha amiga como boa cozinheira (Que ainda é…) tinha-se decidido a fazer um cabrito assado para reunir com o seu grupo de amigos e família. Habito que ainda hoje mantêm com aqueles que ela designa de almoços tropicais… Mas isso é outra história…
Havia um cabrito para assar e era preciso que alguém o fosse buscar.
O jovem como qualquer rapaz solícito ofereceu-se prontamente para o ir buscar, só que…não tinha carro!
Beatriz com a simplicidade de quem ama lhe entregou as chaves do Renaut para ele ir buscar o cabrito.
O jovem pegou no carro e lá se pôs a caminho.
O tempo passou e nem cabrito, nem jovem, nem muito menos o carro apareciam.
Com o receio próprio do desconhecido, Beatriz começou a ficar assustada e preocupada, quando…
Com ar de miúdo que tinha feito asneira, lá apareceu ele com cara de assustado.
- Beatriz…
Diz ele em tom baixo!
- Tive um acidente na estrada de Matize…
- Estás bem?
Pergunta ela com aflição…
- Eu estou, mas o carro ficou muito mal tratado…
Esta parte da história, Beatriz descreve com um ar muito admirado, pois segundo ela e de acordo com o estado do carro, ainda hoje não percebe como foi possível ele sobreviver a tal aparato.
Na altura possuir um carro não era para qualquer um e para Beatriz o seu veículo do dia a dia estava irremediavelmente perdido…
Para o jovem… como poderia ele ressarcir a jovem enfermeira da perda daquele bem material (Embora hoje pareça ridículo, o preço de um Renaut 8 de 1100 rondava os 50 cts e nem toda a gente tinha facilidade em aceder a essa quantia)?
Percebendo a aflição do rapaz, a minha amiga com um olhar de malícia (que ainda hoje ao contar a história se consegue adivinhar…), diz-lhe assim…
- Sabes? Há uma maneira de ficares livre da divida…
- Como?
Pergunta ele curioso.
- É simples! Casas-te comigo, e a divida fica paga…
Nisto a Beatriz interrompe o relato com uma gargalhada gulosa de quem degusta um bom prato.
- A cara que o “gajo” fez… parece que o estou a ver com aquele ar incrédulo…
Engraçado… Mas trinta e dois anos depois, e sem conhecer esta história no contexto em que ocorreu… também a mim me parece estar a ver a cara do jovem.
Enfim! Do pobre Renaut 8 nada restou para alem desta história com um pedido de casamento algo insólito.
Não terá sido de todo em vão pois dois anos depois nascia desse casamento aquela que é hoje (Da minha idade.) a filha da Beatriz.



Luís Fernando de Oliveira e silva

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Uma historia de paixão

Esta é a história de um amigo meu e de como começou a sua paixão por clássicos.
Estávamos em plenos anos setenta quando esta história ocorreu.
Este meu amigo é um homem cheio de sentimento, que coloca paixão em cada palavra que sai de sua boca. Esta história é apenas uma entre tantas que conta…Mas para mim tem um sabor diferente pelo envolvimento sentimental que se percebe no seu olhar.
Como já disse, estávamos em plenos anos setenta. Lírio (chamemos assim) cumpria serviço militar na força aérea, a uma distância considerável de sua namorada, distancia essa que impedia a sua deslocação alem dos fins-de-semana. Filho de famílias modestas a possibilidade de ter um carro limitava-o apenas a deslocar-se em transportes públicos que na altura eram bastante limitativos.
Todas as semanas a namorada reclamava o pouco tempo disponibilizado a ela. Ele coitado sem solução, ficava-se pelo simples encolher de ombros… Pois que podia ele fazer aquele problema instalado?
Um dia num daqueles passeios de mão dada (típicos dos namorados…), passaram junto de um stand de automóveis, em exposição estava um mini de cor preta.
-Lindo!!!
Diz-me Lírio com um olhar comovido de saudade.
A sua condição económica permitia-lhe apenas sonhar com aquele lindo carrinho…
-Sabes? Diz ele para a jovem que estava a seu lado.
-Se tivesse dinheiro para este carro comprava-o e vinha ver-te todos os dias…
A jovem namorada sorriu, como que enternecida com a ideia…
Mas nem uma palavra disse.
Findo o dia, por entre despedidas apaixonadas de juventude, e de promessas de regresso no próximo fim-de-semana. O meu bom amigo lá teve de regressar à base com a saudade de uma semana inteira no coração.
Passada essa semana (Sempre interminável para quem está longe de quem ama) regressou a companhia da namorada.
Esta estava com um sorriso diferente do habitual. Como quem esconde algo…
-Tenho uma coisa para ti!
Sussurrou-lhe baixinho ao ouvido, enquanto lhe colocava qualquer coisa metálica na mão.
-O que é?
Perguntou-lhe ele tentando adivinhar que objecto metálico seria aquele em sua mão…
Apontando pela janela com um sorriso maroto…
-Olha o que está ali fora!
Na mão o Lírio segurava as chaves de um carro e do lado de fora da janela estava o mini preto que na semana anterior ele tanto gostara.
Nesta altura é visível o brilho emudecido de uma lágrima contida no meu amigo Lírio ao recordar aquele momento tão singular.
-Agora não há desculpa para não estares mais tempo comigo…
Disse-lhe ela em tom de gracejo.
A jovem, filha de pais abastados, passou a semana a convencer o pai para comprar aquele mini para o namorado.
Hoje ao contar-me esta história, este meu amigo não confessa de onde nasceu a sua paixão por clássicos e tenta contar esta história apenas como se fosse mais um episódio entre tantos de uma vida cheia.
O namoro por contingências próprias da vida acabou por não vingar, o mini por outras contingências teve de ser vendido…
O que sobrou?
Não sei!
Mas há uma paixão enorme por detrás desta história que leva o meu amigo a possuir cerca de catorze minis todos impecavelmente restaurados pela sua mão.
Quem sabe neles ele tente encontrar o “Lindo” mini preto que um dia alguém lhe deu…



Luís Fernando de Oliveira e Silva

O Vauxhall Viva do Meu Padrinho... Um carro de facho!

Um carro de “facho”.

Corria o ano de 1975 quando o meu padrinho realizou um feito histórico na família. Comprou um carro novo em primeira-mão.
Não era muito frequente, um jovem em começo de vida começar logo por um carro novo a estrear, mas o meu padrinho depois de muito poupar lá conseguiu realizar o seu sonho.
Como já disse corria o ano de 1975, tinha eu na altura 3 anos o único carro que se conhecia na família era o do meu pai que já começava dar muitos sinais de cansaço e diga-se de passagem não era muito elegante.
Ainda hoje recordo a noticia… A minha mãe para mim.
- Filho o teu padrinho comprou um carro novo.
-E é bonito, mãe?
-Não sei! Mas logo quando o teu pai chegar vamos lá vê-lo.
Não descansei mais até o meu pai chegar a casa embora muito pequeno, recordo a minha curiosidade como se fosse ontem.
Começou a cair a noite e isso era sinal de que o meu pai estava quase a chegar a casa. Os meus olhos não desligavam da janela na esperança de que por qualquer motivo o meu padrinho até se decide-se a vir mostrar-me o carro… enfim criancices!
Mas por fim lá caiu a noite e o meu pai veio com ela na velha Raimona (Apelido que o meu pai chamava ao carro, que também era um vauxhall carrinha série há.), enquanto jantava lá a minha mãe ia contando as novidades do dia inclusive da compra do meu padrinho.
As palavras magicas: vamos lá então ver isso.
-Disse o meu pai decidido.
Família na Raimona e lá fomos nós direitos ao carro novo do meu padrinho.
Quando chegamos á entrada da fazenda dos meus avós vimos um carro avançar lento junto á berma da estrada.
Diz o meu pai para a minha mãe…
-Deve ser o teu irmão a experimentar o carro… Então, ele não sabe que metade da estrada é dele? E que não é preciso andar em cima da berma?
-Não sejas assim… Retorquiu a minha mãe!
-Não vês que ele tem carta á pouco tempo?
Meu pai sorriu com olhar trocista mas não tornou a dizer mais nada…
Eu pequeno perdido no banco de traz tentava perceber que carro era aquele tão diferente do, carro do meu pai.
Esguio e baixinho todo brilhante com um ruído silencioso e de cor azul (Pouco perceptível pois era de noite) … muito bonito!
Paramos já dentro da fazenda e esperamos que o meu padrinho fosse ter connosco para mostrar o popó novo.
Quando ele chegou fui logo lá meter o nariz para ver tudo muito bem visto.
O meu pai e o meu padrinho lá ficaram a discutir os pormenores técnicos e a dar os habituais toques com a biqueira do sapato nos pneus (até hoje desconheço qual a finalidade disto pois não estou a ver detectar seja o que for desta forma. Mas que é uma tradição na compra de qualquer carro dar esses toques lá isso é).
Surge então o momento ambicionado. A viagem inaugural.
Entramos todos lá dentro, até para levantar o banco havia um manípulo. O luxo era notório. Sentia-se o cheiro de carro novo e a minha mãe disse ao afundar no banco estofado e fofo: ena, carro de “facho”…
Meu padrinho sorriu amarelo pois aquela expressão apesar de vir da irmã com as memórias frescas do 25 de Abril não era das mais felizes…
Mulheres e crianças atrás e homens á frente e lá arrancou aquele mini passeio de família.
O meu pai sem conseguir resistir teve de dizer…
- Olha que metade da estrada é tua não vás em cima da berma…
Lá se puxou pelos cavalos (pouco para não estragar o popó) e cinco minutos depois estava a volta dada.
Depois disso habituei-me a ver aquele carro azul lindo sempre nas mãos do meu padrinho durante mais de 20 anos. Sempre tive o desejo secreto de ficar com ele um dia mais tarde… mas a vida não se proporcionou a tal. Depois de se fartar de procurar peças aqui e ali para ele o meu padrinho acabou por vende-lo para a sucata.
Já em cima do reboque diz quem viu que o azul apesar de sujo continuava bonito como sempre foi. Mas, o motor… esse já estava silencioso de inércia e sem retorno…
Triste fim para um carro de “facho”…

Luís Fernando de Oliveira e Silva

A "raimona"...


A raimona…


A história que eu conto aqui reporta-se á minha infância nos anos setenta e como é lógico envolve a história de um automóvel que marcou a minha infância. Corria o ano de 1966 quando o meu pai como tantos outros regressou de Angola.
(Meu pai em Angola junto de um willis)
A minha avó na altura tinha um pequeno “lugar” (Pequena mercearia) de frutas e hortaliças que servia de sustento á família.
Estávamos em período de guerra no país e a crise acentuava-se. Os pequenos fornecedores da zona não chegavam para manter a freguesia satisfeita, ávida de produtos frescos, diariamente. As transportadoras acumulavam a maior parte dos lucros e encareciam os preços de forma proibitiva.
A minha avó, mulher empreendedora, rapidamente se apercebeu que era necessária á família e ao negocio um veiculo de transporte que desse resposta ás crescentes necessidades do dia a dia.
Meu avô homem envolvido muitas vezes em questões de politica e com um espírito de justiça e reivindicativo muito próprio não tinha nunca tido a oportunidade de tirar a carta de condução. De qualquer maneira o seu trabalho na marinha mercante também não dava muita margem de manobra para se contar com ele numa tarefa quase diária.
Restava o meu pai jovem de 25 anos com a carta de condução tirada na tropa e que já tinha voltado para ajudar a família.
A reacção não podia ser pior… Estávamos em 1966 com um país em guerra, e a minha avó queria comprar um carro para o qual não havia dinheiro…
Depois de muita teima e de muitos receios lá o meu pai se convenceu. Procuraram um amigo de família que era vendedor da BMW e ele perante as necessidades lá lhe indicou um veículo adequado fruto de uma troca. Tratava-se de uma carrinha vauxhol viva que tinha apenas 12000 km. Negocio feito 24 letras mensais para pagar e uma série de dores de barriga de medo de não as conseguir pagar.
A ideia não podia ter sido melhor. Os produtos eram adquiridos todos os dias e vendidos ainda frescos, a freguesia comprava mais barato e a minha avó embolsava os lucros que dantes eram para transportadoras.
Os anos foram passando, o meu pai casou e a carrinha carinhosamente apelidada de raimona (O meu pai baptizou com este nome pois na altura a raimona era o nome que as pessoas chamavam ás carrinhas da”pide” que vinham buscar os dissidentes a casa á noite. Eram muito semelhantes de cor preta e aspecto quadrado…), continuou na família mais uns anos. 1972 Foi o ano do meu nascimento, o carro da família continuava a ser a “raimona”mas já com bastantes sinais de degradação. Da minha infância recordo as avarias constantes e os habituais pedidos de ajuda a quem passava para dar um empurrão aqui ou ali. As horas que o meu pai passava, a remendar esta ou aquela avaria com os seus conhecimentos de mecânico da tropa… Recordo também o buraco que nasceu debaixo do lugar do pendura e do qual se via a estrada… enfim naquela altura não entendi porque o pequeno orçamento familiar não conseguiu manter a velha carrinha, mas hoje percebo porque se esgotou a paciência do meu pai.
1980 O chassis da carrinha já bastante corroído deixou de oferecer segurança e o meu pai encostou-a definitivamente. Um amigo do meu pai ainda a comprou e a levou para Setúbal com ideias de a recuperar mas infelizmente desistiu logo de início. Na minha meninice de então chorei com muita mágoa por o meu pai ter vendido o carro e por pirraça escondi a chave sobresselente que ainda hoje conservo religiosamente como recordação.
Da carrinha nada mais soube até mais ou menos dois anos em que descobri que ela esteve abandonada no hospital do Outão onde trabalha esse amigo do meu pai até a cerca de quatro anos e de onde foi para a sucata sem grandes honras e méritos.
Para a recordar ficou a chave, e as fotos de outra que foi entregue para abate e que eu não consegui salvar…